3 “Pereça
o dia em que nasci, e a noite em que anunciaram: ‘Nasceu um menino!’
4 Esse dia,
que se torne em trevas; Deus, do alto, não se lembre dele, e sobre ele não
brilhe a luz! 5 Que o obscureçam as trevas e a sombra da morte! Que a escuridão o
domine, e seja envolvido pela amargura!
6 Aquela noite… um tenebroso redemoinho a
arrase, e não se conte entre os dias do ano, nem se enumere entre os meses!
7 Que
essa noite fique estéril e não seja digna de louvor.
8 Que a amaldiçoem os que
amaldiçoam o dia, os que estão prontos para despertar Leviatã!
9 Que se
obscureçam as estrelas do seu crepúsculo. Essa noite espere pela luz – e a luz
não venha, ela não veja as pálpebras da aurora.
10 Pois não fechou a porta do ventre
que me trouxe, e não escondeu dos meus olhos tantos males!
11 Por que não morri
no ventre materno, ou não expirei logo ao sair das entranhas?
12 Por que em dois
joelhos fui acolhido e em dois peitos, amamentado? 13 Pois agora, dormindo, eu
estaria calado e repousaria no meu sono, 14 com os reis e governadores da terra,
que constroem para si mausoléus, 15 ou com os nobres, que possuem ouro e enchem
de prata suas casas. 16 Ou, como um aborto ocultado, eu não existiria, ou como os
que, concebidos, nem chegaram a ver a luz. 17 Ali acaba o tumulto dos ímpios, ali
repousam os que esgotaram as forças. 18 E os que haviam sido prisioneiros não são
mais molestados, nem ouvem a voz do capataz. 19 Ali estão pequenos e grandes, e o
escravo está livre do seu senhor. 20 Por que foi dada a luz a um infeliz e a
vida, àqueles que têm a alma amargurada? 21 Eles aguardam a morte e ela não vem,
e até escavam, procurando-a mais que a um tesouro: 22 eles se alegrariam
intensamente, e ficariam muito felizes diante do sepulcro. 23 Por que, então, dar
à luz alguém cujo caminho está oculto e a quem Deus cercou de trevas? 24 Em vez
de comer, fico suspirando e o meu rugido é como águas de enxurrada. 25 O que eu
mais temia, aconteceu comigo; o que eu receava, me atingiu. 26 Não dissimulo, não
me calo, não me aquieto: a ira de Deus veio sobre mim!”
Comentário
1. Ao amaldiçoar o seu nascimento e ao lamentar a sua miséria (3:1 e seguintes), Jó fala
do que sente, sem a preocupação de filtrar os sentimentos, nem de dizer apenas o que
era teológica ou socialmente conveniente. Este é o momento da sua catarse, que de
acordo com a psicanálise, consiste na exteriorização verbal, dramática e emocional da
dor. Aqui vemos o homem Jó na plenitude da sua humanidade e da sua humilhação.
2. Jó parece ficar perplexo e confuso acerca de Deus, pela primeira vez na sua vida.
Ele sabe que Deus existe, mas não entende o que está a acontecer. Deus é um mistério,
porque está envolto em neblina.
Ludgero Coelho
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