É
muito comum as pessoas usarem o termo carência afetiva para definir o
comportamento inadequado de alguém. Não deixa de ser uma atitude
leviana, pois a carência afetiva é algo profundo, que faz sofrer e
atrapalha tremendamente a vida de quem carrega essa marca da infância.
O ser humano é fruto da índole com que nasce – carga genética e
natureza – e do meio ambiente – pessoas, local onde vive, educação,
exemplos, atendimento de suas necessidades, orientação. Esses
componentes contribuem radicalmente para a formação de seu caráter e sua
personalidade e das descobertas que faz de si mesmo.
Desde que nasce
até o dia em que morre, mas principalmente nos primeiros anos de vida, o
homem precisa receber amor, afeto e carinho para que possa se
desenvolver de maneira adequada, de acordo com sua realidade. Dessa
forma, aprende a ter responsabilidade, respeito, disciplina, limite e
garra. Torna-se capaz de lidar com as frustrações, com o medo, com a
angústia e com as limitações. Depende, pois, desse aprendizado, a forma
de a pessoa se posicionar perante a vida.
Se alguém na infância
recebe na medida certa o amor, o carinho, o afeto, o apoio e – por que
não? – também a bronca ponderada, mas sente-se valorizado, estimulado,
elogiado, bem como corrigido, desenvolve-se de forma adequada. Se, pelo
contrário, vive num ambiente desestruturado, em que não é ajudado a se
desenvolver, a se descobrir, a participar, a se posicionar, sua
personalidade fica esburacada. Um desses buracos é formado pela carência
de afeto. Quando não o recebe na dosagem certa, a pessoa se ressente,
carregando essa deficiência como um pesado fardo pela vida afora. Se não
entender o porquê desse vazio interior que sente e não tentar
superá-lo, será uma pessoa muito infeliz, porque sempre estará
insatisfeita, por mais afeto que receba. Numa comparação bastante
vulgar, sua vontade de comer será maior que a comida existente.
Estas
pessoas são mal-amadas e não resolvidas consigo mesmas. Não gostam de
si e se julgam incapazes de serem amadas, porque não foram satisfeitas
quando crianças na área do amor e do afeto. A carência afetiva é “irmã
gêmea” da rejeição. A pessoa sente-se rejeitada porque não recebeu amor.
Não se sente amada porque, de certa forma, se encolhe, não acreditando e
não confiando em si. Mas se não acredita em si, é porque não recebeu
esse crédito. Resultado: sua vida é marcada pela revolta, pela apatia,
pelo isolamento, pela agressão, pela fuga e pela tirania. E impossível
avaliar os estragos que a carência afetiva ocasiona dentro da pessoa.
Essa
forma de ser e agir faz sofrer em excesso quem é vítima desse mal, pois
o afasta dos colegas de trabalho, dos amigos e da família. É que ele se
torna tão egoísta e frio que não sabe transmitir afeto para os outros.
Tem medo de mostrar seus sentimentos.
Quando alguém percebe que
precisa muito de afeto, de carinho, e que não vive no presente, mas quer
compensar o passado que não teve, não conseguindo superá-lo, tem de
procurar ajuda. E um sinal claro de que a carência afetiva o está
dominando e chegou o momento de sair de si, para administrar essa
verdade que não quer aceitar.
Parece frio falar dessa forma, mas é
possível aos que são mais equilibrados chegar à conclusão de que, se não
foram amados na infância por determinadas pessoas, hoje podem ser
amados por milhares de outras. Se não tiveram pais que os amaram da
forma como necessitavam, podem ter um irmão, um filho, um amigo, alguém
que os respeite, os admire. E por esse lado que se deve pender, a fim de
superar e preencher um pouco esse vazio. A lacuna ficou, mas é possível
remediá-la, colocando um novo amor, preenchendo a vida com o afeto
pêlos outros e deixando-se amar. Isso é que lhe dará forças para vencer
essa barreira. Quando a pessoa não se ama e não se sente, amada,
dificilmente consegue superar seus limites. É possível compensar essa
falta dando afeto, em vez de só querer recebê-lo.
Aquele que sente
que seu comportamento não está natural, tem de procurar a causa disso.
Já que a carência faz sofrer tanto, é preciso buscar soluções e jogar
fora o negativo que impregnou sua vida. Deve-se eliminá-lo para poder
ser feliz, sentir-se amado, contente, satisfeito, afetuoso, sensível,
sem medo e sem ficar com aquele vazio no estômago eternamente. Se a
pessoa sabe administrar bem seus sentimentos e faz uma experiência
profunda de amor, consegue superar essa situação.
Carência afetiva é
uma doença de caráter emocional que se esconde no íntimo do indivíduo,
mas que pode ser curada com muito carinho e afeto
Luiz Carlos Gomes