Um dos maiores sofrimentos
em nossa maneira de nos relacionarmos são as sérias dificuldades na
comunicação. O crescimento emocional e a maturidade afetiva são a base
das relações saudáveis e de uma sociedade madura. Na verdadeira comunhão
aconchega-se a mudança mais potente.
“Em
nossa sociedade contemporânea, o ser humano se vê cada vez mais privado
do reconhecimento essencial que implica a confirmação afetiva de sua
existência” (Frans Veldman).
A
vida afetiva humana, com suas interações, relações e sua problemática
intrínseca, é a trama que sustenta o mundo em todas suas esferas, tanto
privadas como públicas. No entanto, as potencialidades afetivas são frequentemente asfixiadas, subestimadas, descuidadas, quando não
ignoradas. Amadurecer e crescer são, antes de mais nada, tarefas
individuais, e seu reflexo mais fiel se projeta no espelho da sociedade.
Não
se pode evoluir e crescer como ser humano íntegro sem desenvolver e
amadurecer emocionalmente. Não há sociedade madura sem indivíduos
íntegros. A imaturidade política, social e educativa que rege nossa
cultura é expressão da imaturidade emocional dos indivíduos que a
integram; sob a aparência de adultos, a grande maioria são seres que
evolutivamente mal superam a infância precoce ou a puberdade (1).
Desenvolver o núcleo mais íntimo de
nosso ser, desenvolver a própria identidade como a capacidade de formar e
manter relações, constituem as propriedades mais importantes de todo
ser humano.
Identidade e
alteridade são as duas caras de uma dimensão primária da existência
humana. Se um ser se transforma realmente em adulto, se a pessoa atinge
certa liberdade, é também livre em seus comportamentos e isto implica
uma fluidez de papéis e responsabilidades nas relações interpessoais. A
capacidade de amar profundamente e estabelecer autênticas relações
humanas é imprescindível.
Também
somos capazes de criar diferentes tipos de relações e estas adquirem
muitas formas: relações superficiais e sem um verdadeiro contato,
modelos de dependência nos vínculos que bloqueiam a individualidade ou
distorções e perturbações na comunicação.
Mas
o mais importante passa inadvertido: psicologicamente, continuamos
prolongando a precoce dependência emocional da infância, e com essa
profundidade psíquica encaramos o mundo e a própria vida. É complexo
viver, mas a maior parte da pena e do conflito é consequência direta do
estado de imaturidade psicológica em que nos encontramos e que nem
sequer é advertida como tal.
Se o destino natural de todo ser
humano é crescer e amadurecer: por que se torna tão difícil atingir uma
verdadeira maturidade afetiva? Muitos nem sequer se propõem isso; vivem
tão ocupados em atingir o sucesso, o poder, o dinheiro e o
reconhecimento, projetos meramente externos, que nunca conseguem
relacionar suas ânsias e suas angústias profundas com a falta de
crescimento afetivo e espiritual. E muitos outros guardam o desejo de
amadurecer e evoluir, mas são muitos os obstáculos que encontram, e
confundidos, frustrados ou resignados, claudicam na busca interior ou
acabam consumindo fórmulas mágicas e alheias que, inevitavelmente,
afastam e desviam do próprio caminho vital.
A
vida é um drama formativo; drama entendido como o desenvolvimento de
experiências vitais e simbólicas que marcam a passagem de uma etapa a
outra de maior maturidade, de integração e autoformação.
“Os
jovens sabem que, para honrar a vida que seus pais lhes deram, devem
deixar o pai e a mãe, ir ao encontro da sociedade e, longe da casa
paterna, assumir sua feminilidade ou sua virilidade” (Françoise Dolto).
O
caminho do amadurecimento é um processo de diferenciação e individuação
psicológica; para crescer e amadurecer como verdadeiros seres livres e
íntegros é necessário separar-se emocionalmente dos pais. Nenhum ser
humano pode ser atributo, objeto ou complemento submetido à dependência
de outro.
Quantos filhos estão
fechados ao seu próprio desejo e vitalidade por pais que os pressionam
com solicitação abusiva e mandatos esclerotizantes (2). O maior dom que
os pais —verdadeiros ou substitutos— podem brindar aos filhos é
separar-se e diferenciar-se deles — “cortar o cordão umbilical”— para
que possam ter acesso a sua própria identidade, a um desenvolvimento
emocional individual.
Não só os
filhos devem “deixar o pai e a mãe”, são os pais, sobretudo, é que devem
deixar os filhos irem embora. Alguns pais, muito poucos, permitem o
crescimento e a abertura à vida, mas a grande maioria, devido às
estruturas familiares rígidas e às carências emocionais próprias, freiam
o processo natural de separação e diferenciação de todo crescimento.
Deste
modo, cresce na tensão e na culpa e, sem saber, sob um estresse crônico
que será a base de muitas relações emocionais perturbadoras. A maioria
das pessoas continuam sendo psicologicamente filhos –“os filhos da
infância”– e a maioria dos pais continuam exercendo o papel de “pais da
infância”. Assim, a relação entre pais e filhos permanece ancorada nos
primeiros anos infantis ou, no melhor dos casos, na adolescência (3).
A
imaturidade da relação entre pais e filhos continua vigente ao longo da
vida —por isto continua sendo uma relação conflitiva— e se projeta em
todas as áreas do mundo adulto. Em grande parte da sociedade os papéis
que os adultos cabais deveriam exercer estão nas mãos de “meninos
dependentes” ou “adolescentes desenfreados” emocionalmente —ainda que em
aparência possuam atributos de poder e autoridade—. Queremos realmente
amadurecer? Do ponto de vista físico, não temos outra opção, mas quanto
ao psicológico e espiritual, podemos decidir deter-nos, não atravessar o
próximo portal e, se aparentemente avançamos, num nível mais profundo
dizemos “não”.
Cada etapa
concluída é o fundamento da seguinte. Confiar nos tempos da vida e em
suas oportunidades para crescer e amadurecer nos proporciona a segurança
básica e fundamental para viver.
Quando
nos transformamos em adultos? Quando encontramos em nós mesmos nossa
verdadeira fonte de vida e criatividade; quando chegamos a ser nossa
própria mãe, nosso próprio pai e, portanto, nosso próprio filho. Se
formos suficientemente livres, autônomos e fortes, aprendemos a
relacionar-nos de um modo mais saudável e maduro, sem criar dependências
nocivas e ataduras.
Ángela Sannuti. Escritora Argentina. Artigo publicado na revista Criterio, www.revistacriterio.com.ar
Do site: http://amaivos.uol.com.br/amaivos
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