quinta-feira, 10 de julho de 2014

Existe felicidade plena?


Esse é o mundo da relatividade. Somos assim, relativos, vivendo entre o sentimento de que somos eternos e a constatação da finitude do corpo, portadores da chama do bem e da sombra do mal, divididos entre o agora e o que foi, fixados no que será, ainda que tudo só aconteça no agora.
Expostos aos opostos, habitados pela fé e pelo medo, casa de Deus e portadores de milhões de desejos, amantes que odeiam, caminhantes, buscadores, sedentos que se recusam a beber, perdidos que não querem voltar para casa. Sendo assim, até que ponto a felicidade é plena e existe realmente? Sim, a felicidade é plena. Sempre é.
Ela ocupa todos os espaços, ainda que conviva com a relatividade, ainda que, nela, caiba pontuações de tristezas, de questionamentos, de dúvidas, de dor. Felicidade não é alienação. Não depende de acontecimentos, não se desvia dos confrontos naturais e presentes na relatividade de existir nesse tempo, nesse corpo, nessa vida.
Estar alegre não é ser feliz. Experimentar tristeza, não é infelicidade.
Ser feliz tem a ver com a capacidade de manter-se grato, consciente do milagre de estar vivo, atento às dinâmicas da vida que não cessam, não param, não poupam ninguém. É saber que alegria plena, linear, constante, nos embriagaria.
Felicidade é viver cada dia sua própria porção, aprendendo a projetar significado no caminho, nem bem, nem mal, nem benção, nem tragédia, acontecimentos que ensinam a não depender de alegrias, mas fixar-se na dimensão da felicidade. Ser feliz é ser.
É viver consciente de que não sabemos ao certo o que é bom e mau e, exatamente por isso, caminharemos entre os acontecimentos silenciosamente, pacificados, reverentes, atentos para as lições de cada um, de cada dia, de cada instante, de cada frame. A vida só é possível na dimensão da felicidade.
Só uma pessoa feliz é capaz de enxergar do que as coisas são feitas, do que realmente precisa, o que de fato faz diferença e, por isso, não corre desmensuradamente atrás de “alegrias” ainda que as tenha, ainda que uma vida sem alegrias seria morte, ainda assim, as recebe com naturalidade sem tornar-se refém de esteriótipos.
Ser feliz é saber lidar com as tristezas desse tempo, consciente que é justamente a plenitude da felicidade que nos dá forças para enfrentar e passar o dia mau, os labirintos, as dores de ser em um corpo finito, de existir em meio a tantas contradições, entrar no túnel escuro, sentir medo, querer parar, mas continuar e sair do outro lado, mais forte, mais consciente, em paz, feliz.

Flavio Siqueira

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