quinta-feira, 4 de setembro de 2014

É preciso acordar

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Um dia nós soubemos. Não conhecíamos a tecnologia avançada, o poder de conectar máquinas, de vencer a gravidade, de reunir tantas informações em pequenos aparelhos, estávamos muito longe disso, mas houve um tempo em que a maioria sabia, sentia.
Talvez não houvesse a consciência clara dos significados, mas cada homem e mulher, cada idoso, cada criança sentia que era parte de algo maior.
Começava com o sol pela manhã, seus raios, sua energia tocando cada centelha de vida, iluminando caminhos que não iam tão longe, grupos, aldeias, tribos, gente que se misturava em conexão uns com os outros, mais nós do que eu, reverenciando a natureza e seus fenômenos, sentindo os cheiros, percebendo os movimentos, atentos aos sinais que desciam do céu, subiam da terra e chegavam do mar.
Todos parte de uma coisa só, vinculados em nome da sobrevivência, co existindo em uma única dimensão.
Um dia soubemos que havia algo mais dentro da gente. Não havia tanta teoria, as explicações eram escassas, cheias de símbolos e arquétipos, mas isso não importava, afinal, ouvíamos, enxergávamos, tocávamos, cheirávamos, lambíamos o sagrado que estava em tudo, em todos, em nós.
Deus estava em nossas canções, descansava na natureza, acompanhava os animais, passeava em nossas terras e habitava dentro da gente, nos dava bom dia quando acordávamos e, a noite, sem medo do escuro, sem fugir do silêncio, atentos as sinfonias dos grilos e dos bichos que dormem de dia, dávamos boa noite e pedíamos sua proteção.
Houve um tempo que nossos sonhos eram coletivos, nossa fé abrangente, nossos vínculos necessários. Estávamos conectados e sabíamos sem explicar, conhecíamos com naturalidade, eramos mestres uns dos outros e aprendizes de todos. Já faz tempo que as coisas mudaram.
Aqueles seres quase divinos que caminhavam pela terra se esqueceram de quem são. Permitiram-se condicionar, fecharam seus olhos para o mistério de ser, pensam que são o que não são, vivem sem saber a razão, fogem da morte, fogem do outro, fogem de si mesmos. Houve um tempo que ficou em algum ponto da história, mas não deixou de existir.
Esse tempo é o tempo da eternidade, fragmento do hoje, momento agora que se renova sempre que uma consciência começa a despertar. Há uma dimensão dentro de nós, acessível para todo aquele que interrompe o caminho do fluxo da cegueira, se questiona, se aquieta, se percebe e entende que o sagrado é. Não está lá, muito menos se projeta em objeto algum, mas vive em nós.
Estamos todos conectados, somos parte de algo maior, sentimos, percebemos, mas quem pode explicar? É preciso despertar, descondicionar-se e ouvir Deus na gente.
O tempo das conexões, do divino, do sagrado jamais deixou de existir. Ele acontece agora em algum lugar dentro de cada ser vivo que passeia pela terra, que experimenta esse lapso que chamamos de vida, que acorda pela manhã sem notar o milagre que é. Que um dia está aqui, no outro, quem sabe? É preciso silêncio. É preciso reverencia. É preciso acordar.

Flavio Siqueira

A saudade fala português


Eu tenho saudades de tudo que marcou a minha vida
Quando vejo retratos, quando sinto cheiros,
Quando escuto uma voz, quando me lembro do passado,
Eu sinto saudades...

Sinto saudades de amigos que nunca mais vi,
De pessoas com quem não mais falei ou cruzei...


Sinto saudades da minha infância,
Do meu primeiro amor, do meu segundo, do terceiro,
Do penúltimo, e daqueles que ainda vou vir a ter,
Se Deus quiser...

Sinto saudades do presente, que não aproveitei de todo,
Lembrando do passado e apostando no futuro...

Sinto saudades do futuro, que se idealizado,
Provavelmente não será do jeito que eu penso que vai ser...

Sinto saudades de quem me deixou e de quem eu deixei,
De quem disse que viria e nem apareceu;
De quem apareceu correndo, sem tempo de me conhecer direito,
De quem nunca vou ter a oportunidade de conhecer.

Sinto saudades dos que se foram
E de quem não me despedi direito,
Daqueles que não tiveram como me dizer adeus;
De gente que passou na calçada contrária da minha vida
E que só enxerguei de vislumbre;
De coisas que eu tive e de outras que não tive, mas quis muito ter;
De coisas que nem sei como existiram, mas que se soubesse,
De certo gostaria de experimentar; 


Quantas vezes tenho vontade de encontrar não sei o que,
Não sei aonde,
Para resgatar alguma coisa que nem sei o que é 

E nem onde perdi...
Vejo o mundo girando e penso que poderia estar
Sentindo saudades em japonês,
Em russo, em italiano, em inglês,
Mas que minha saudade,
Por eu ter nascido brasileira,
Só fala português embora, lá no fundo, possa ser poliglota.


Aliás, dizem que se costuma usar sempre a língua pátria,
Espontaneamente, quando estamos desesperados,
Para contar dinheiro, fazer amor e declarar sentimentos fortes,
Seja lá em que lugar do mundo estejamos.
Eu acredito que um simples "I miss you",
Ou seja, lá como possamos traduzir saudade
Em outra língua, nunca terá a mesma força
E significado da nossa palavrinha.


Talvez não exprima, corretamente,
A imensa falta que sentimos de coisas ou pessoas queridas.


 

E é por isso que eu tenho mais saudades...
Porque encontrei uma palavra para usar
Todas as vezes que sinto este aperto no peito,
Meio nostálgico meio gostoso,
Mas que funciona melhor do que um sinal vital
Quando se quer falar de vida e de sentimentos.

Ela é a prova inequívoca de que somos sensíveis,
De que amamos muito do que tivemos e lamentamos as coisas boas
Que perdemos ao longo da nossa existência...
Sentir saudade é sinal de que se está vivo!



Desconhecido