segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Sim, você pode corrigir fraternalmente alguém que esteja em pecado

 E, se o teu irmão pecar contra ti, vai, e corrige-o entre ti e ele só. Se te ouvir, ganhaste o teu irmão. Se, porém, te não ouvir, toma ainda contigo uma ou duas pessoas, para que pela boca de duas ou três testemunhas se decida toda a questão. E, se ele os não ouvir, dize-o à Igreja. E, se não ouvir a Igreja, considera-o como um gentio e um publicano. (Mt 18,15-17).

Será que isto é algo que se possa fazer hoje, assim tão sequencial, até chegar a uma solução final? Será isto fácil de pôr em prática? É que, ao falar sobre esse assunto, vem-nos sempre a lembrança da cabeça decepada de São João Baptista, o qual foi posto na prisão por se atrever a dizer a Herodes: “Não te é lícito ter a mulher de teu irmão!” (Mc 6, 18) de nome Filipe. A mulher de Filipe era Herodíade, portanto cunhada de Herodes, vivendo os dois então em estado de adultério público.
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Dizem as pessoas de senso “prático” que, se São João Baptista tivesse feito vista grossa e, de si para consigo, dissesse, como se  ouve hoje dizer perante todos os desvarios do nosso tempo: “Temos de ser tolerantes!”, ele teria provavelmente acabado por ser solto e  morrido com a cabeça colada ao pescoço.
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Mas Herodíade, a tal mulher do irmão de Herodes, não gostou daquela increpação, irritou-se e jurou tirar vingança daquela  voz incômoda que lhe produzia, de noite e dia, fantasmas  acusadores. Aguardava uma oportunidade para o ver morto, oportunidade  que tardava, mas que surgiu finalmente. Eis o relato bíblico:
Mas, chegando um dia oportuno, Herodes, no aniversário do seu nascimento, deu um banquete aos grandes da corte e aos tribunos e aos principais da Galiléia. E, tendo entrado (na sala) a filha da mesma Herodíades, e tendo dançado e dado gosto a Herodes e aos que com ele estavam à mesa, disse o rei à moça: Pede-me o que quiseres e eu to darei; e jurou-lhe: Tudo o que me pedires te darei, ainda que seja metade do meu reino. .
“Herodes tinha mandado prender João, e teve-o em ferros no cárceres por causa de Herodíades, mulher de Filipe, seu irmão, porque ele a tinha tomado (ilicitamente) por mulher.
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Porque João dizia a Herodes: Não te é lícito ter a mulher de teu irmão. E Herodíades armava-lhe ciladas, e queria fazê-lo morrer; porém não podia, porque Herodes temia João, sabendo que era varão justo e santo; e defendia-o, e pelo seu conselho fazia muitas coisas, e ouvia-o de boa vontade.

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E ela, tendo saído, disse à sua mãe: Que hei de eu pedir? E ela respondeu-lhe: A cabeça de João Batista. E, tornando logo a entrar apressadamente junto do rei, pediu, dizendo: Quero que imediatamente me dês num prato a cabeça de João Batista.
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E o rei entristeceu-se; mas, por causa do juramento e dos que com ele estavam à mesa, não quis desgostá-la; e, enviando um guarda, mandou-lhe trazer a cabeça de João num prato. E ele, indo, o degolou no cárcere; e levou a sua cabeça num prato, e a deu à moça, e a moça a deu à sua mãe… ”. (São Marcos,  6, 17-28).
Assim terminou a vida terrena de São João Batista, mártir da correção fraterna. Este exemplo será para imitar? Vamos por aí fora dizer a todos os adúlteros, homossexuais, pedófilos, espíritas, bruxos(as), curandeiros, membros de seitas protestantes, católicos não praticantes, católicos somente casados pelo civil, drogados, alcoólicos, traficantes ou consumidores de droga, etc., que não lhes é lícito viver ou agir daquela maneira?
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O que se nos pede, então? É-nos pedido que exerçamos a nossa influência na correção fraterna entre aqueles com quem temos alguma familiaridade, seja mesmo na família, no local de trabalho, na escola, entre amigos e aqueles com quem convivemos.
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A obrigação da correção fraterna, no sentido de alterar desvios, cabe em primeiro lugar aos sacerdotes, aos pais, aos professores e formadores, aos Superiores dos seminários e conventos. Em suma, a todos nós, no nosso círculo de amizades e relacionamentos.
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Podemos interrogar-nos: Será que tenho algum direito de corrigir seja quem for? Fui por acaso constituído mestre de alguém? Se “não tiro a trave do meu olho”, como vou dizer a alguém que tire “um argueiro” do seu?  Como vou receber o retorno das minhas palavras, se me retrucarem:
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“Meta-te na tua vida!, isto não é nada da tua conta!”, “Cada um é que sabe de si e Deus sabe de todos”, “Estás para aí a armar-te em santinho, quando tu és um…, fazes isto e aquilo…”, “O que é que te deu, para te armares agora em conselheiro e mestre? Será que tu sabes o suficiente para ti?”, “Não podemos ser fundamentalistas!”, “Os tempos são outros e temos que nos adaptar”, “Temos de ser tolerantes como Cristo, que até nem condenou a mulher adúltera”,  etc.
Quem não quer aceitar qualquer aviso, conselho, correção, encontra todo o tipo de argumentos para continuar no seu erro.
Este último argumento  de que Nosso Senhor Jesus Cristo não condenou a mulher adúltera é muito frequente ouvir-se, até da boca de sacerdotes e catequistas.  Mas há que esclarecer: Cristo não  condenou a mulher  à morte,  porque ela já vinha condenada e tudo estava pronto para a sua execução, como mandava a Lei. E também não disse: “Não a executeis!”.
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Limitou-se a desfazer a trapaça dos executores, pois eles só queriam apanhar Nosso Senhor em falso, para o acusar de ser um violador da sagrada Lei. Por isso, Nosso Senhor não precisava de confirmar a sentença de morte, mas condenou o seu comportamento adúltero: “Vai e não peques mais!”
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Este episódio do Evangelho é muitas vezes invocado por progressistas (católicos adeptos de inovações mundanizantes), para justificar a sua incapacidade ou falta de coragem para ir ao fundo da questão e não embalar comodamente em opiniões e pontos de vista que não estão de acordo com a correta interpretação dos ensinamentos sagrados de Nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nunca foi, nem podia ser, tolerante com o pecado, embora, como neste caso da mulher adúltera, tenha sido bondosamente compassivo, como também não podia deixar de ser, uma vez que a Deus quer que o pecador se converta e tenha vida longa  ou tenha vida longa para se converter e expiar os seus pecados ainda nesta vida.

Requer-se aqui do dom do Entendimento  (ler por dentro) para descobrir qual o verdadeiro sentido daquilo que lemos. Nosso Senhor Jesus Cristo deu-nos, nesse episódio, um exemplo de correção fraterna, deixando supor que a mulher a aceitou, pois não consta o contrário.
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Põe-se o problema: para corrigir, avisar, aconselhar alguém, preciso eu próprio de saber qual é o caminho certo. Para isso, só conhecendo e vivendo a Lei de Deus, os ensinamentos e os exemplos dos santos é que me sentirei em condições de aconselhar, de sugerir, de corrigir. Se sou ignorante neste assunto, como posso ambicionar aconselhar outros?
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Todos aqueles que têm a obrigação de corrigir e não  o fazem, podendo fazê-lo, cometem certamente pecado de omissão, acabando por ser responsáveis, se não tiverem feito nada nesse sentido. Nenhum esforço nesse sentido tem resultado garantido, porque o homem tem possibilidade de pensar, de agir, de aceitar ou recusar, de ir por este caminho ou por aquele.
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Nestes casos de rejeição de bons conselhos, Nosso Senhor Jesus Cristo dá-nos a orientação: “Fazei de conta que são pagãos e deixai-os!” Entretanto, quem fez o que pode, e cumpriu o seu dever, este fica isento de responsabilidades pelas consequências.
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O dever de corrigir, avisar, aconselhar, é para todo católico, o qual não deverá fazê-lo para exibir  superioridade ou alimentar o seu egoísmo, mas apenas por ser uma obra de caridade, uma obra de misericórdia espiritual de muito valor para a salvação, nossa e dos outros.
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A verdade é que cada um de nós, tendo a obrigação de se salvar, tem também a obrigação de contribuir para a salvação de outros. É um fato aceite  que ninguém se salva sozinho e  que quem contribui para salvar  almas de outros também salva a sua. Tem custos? Pode ter e muitos.
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Verifica-se, por vezes, em famílias, que um dos pais se opõe sistematicamente a tudo o que seja limitar aos filhos a liberdade de fazer tudo o que eles querem   e como querem, acabando por acontecer que, para salvar a harmonia do casal, aquele que é mais exigente na luta contra os desmandos dos filhos  acaba por se desinteressar e deixar as coisas correrem. Aquele que se opuser à correção dos filhos  peca por omissão.
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Isso acontece porque um dos cônjuges, para manter a sua imagem dourada junto aos filhos, é incapaz de agir no sentido da correção. Pior ainda: não faz  e opõe-se a que o outro o faça. Ser ou ficar bem visto torna-se aqui um valor supremo, o que pode redundar em consequências funestas para si e para os filhos. Entretanto, é certo que o ambiente familiar vai se deteriorando.
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As obras de misericórdia  foram instituídas para serem universalmente cumpridas. As obras de misericórdia, espirituais, são: Dar bom conselho, ensinar os ignorantes, castigar os que erram, consolar os aflitos, perdoar as injúrias, sofrer com paciência as fraquezas do próximo, rogar a Deus por vivos e defuntos.
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As obras de misericórdia, corporais, são:  Dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem  tem sede, vestir os nus, dar pousada aos peregrinos, visitar os enfermos e os presos, remir os cativos, enterrar os mortos.
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Sendo a correção fraterna (corrigir os que erram) uma delas, e sendo elas obras de caridade, cabe a todos a santa missão de aconselhar, avisar, corrigir, emendar, sempre que surja ocasião e condições para isso.
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Mas essa correção não deve ser causada por antipatia, rancor, cólera, insultos, juízos apressados, preconceitos firmados e críticas azedas, o que contribuirá para agravar a situação e levar à rejeição de qualquer conselho.
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Sendo obra de caridade, será com mansidão, calma,  tom de voz controlado, deixando liberdade à pessoa de se explicar, de se esclarecer, de pensar, de decidir.
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Diz o povo que se apanham mais moscas com mel do que com vinagre.  O mel é a caridade  (amor), paciência, suavidade verbal, mansidão…; o vinagre é o  azedume, o  mau-humor, a  crítica irritada, a cólera, o gesticular descontrolado, o tom de voz exaltado e descontrolado, a agressividade verbal.
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“Se o teu irmão pecar, vai ter com ele e repreende-o a sós!…” (Mt 18,15)

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